Compartilho da Revista Isto é a matéria sobre Aracy esta que deveria ser exaltada homenageada no lugar de falsos heróis que viveram no armário ou que nos enchem de vergonha pelo uso de drogas lutando como se fossem animais em uma rinha .....
Uma heroína quase esquecida A fascinante história de Aracy Guimarães rosa, uma brasileira que ajudou a salvar dezenas de judeus do nazismo e foi colocada por Israel no mesmo patamar de mitos como Oskar Schindler Por CLÁUDIO CAMARGO E HUGO STUDART
Paranaense de Rio Negro, filha de pai brasileiro e mãe alemã, separada do primeiro marido, Johannes Edward Ludwig Tess, numa época em que o casamento era sagrado, Aracy Moebius de Carvalho mudou-se para a Alemanha em 1934 para morar com uma tia e com o filho Eduardo, então com cinco anos. Fluente em alemão, francês e inglês, encontrou trabalho no consulado brasileiro em Hamburgo, como chefe do setor de vistos. Chocada com a perseguição aos judeus promovida pelo nazismo, Aracy resolveu ignorar as determinações do Itamaraty para impedir a entrada dos "semitas" no Brasil e ajudou a conceder vistos a dezenas deles, talvez uma centena. Em 1938, o diplomata João Guimarães Rosa, que depois se tornaria um dos maiores escritores brasileiros, foi nomeado cônsul-adjunto em Hamburgo. Ele teve pleno conhecimento da "transgressão" de Aracy e lhe deu apoio. Casaram-se em 1940. Viveram em Hamburgo, sob bombardeios da RAF (Royal Air Force), até voltarem ao Brasil, em 1942. Grande sertão: veredas, de 1956, obra-prima da literatura brasileira, foi dedicado a Aracy, carinhosamente chamada de "Ara" por Guimarães Rosa. Dedicado, não; dado: "A Aracy, minha mulher, Ara, pertence esse livro".
Segundo a Concise Encyclopedia of the Holocaust, editada pela International School for Holocaust Studies, Yad Vashem, Aracy começou a ajudar os judeus depois do progrom ocorrido na noite de 9 de novembro de 1938, que ficaria conhecido como Kristallnacht - Noite dos Cristais. Naquela noite, hordas nazistas na Alemanha e na Áustria atacaram e destruíram sinagogas, residências e estabelecimentos comerciais judaicos, matando cerca de 90 pessoas, marcando o início da repressão aos judeus que terminaria na "solução final", o extermínio puro e simples. Apesar de ter um filho pequeno e a mãe que dependia dela, Aracy não se intimidou. "Minha mãe achava aquilo tudo injusto, ignorou a determinação do Itamaraty e, com a maior discrição, continuou a preparar os processos de vistos para judeus, à revelia de seus superiores", disse a ISTOÉ o advogado Eduardo de Carvalho Tess, filho de Aracy. Para tanto, ela contou com a cumplicidade de um funcionário da polícia de Hamburgo, que emitia passaportes para judeus sem o infame "J" vermelho que os identificava como tais. Isso viabilizava a emissão de vistos para eles, que passavam por europeus. "Depois, ela enfiava os vistos no meio da papelada que despachava com o cônsul-geral, que os assinava sem ver", diz Tess. clandestinamente o carro do serviço consular para transportar judeus que se escondiam em sua casa e em casas de amigos e para distribuir entre eles alimentos que ela desviava da cota que o consulado recebia - na época da guerra, a Alemanha vivia sob racionamento. "Muitas vezes, ela transportou judeus no porta-malas do carro do consulado. Eu me lembro que era um Opel Olympia alemão. Chegou a levar uma pessoa até a Dinamarca", diz o filho. Personalidade forte, Aracy não se intimidava quando era parada pela Gestapo. Pelo menos uma vez, enfrentou os policiais de dedo em riste, desconcertando-os com seu alemão impecável. "Minha mãe exibia muita segurança e autoridade, os alemães respeitavam a autoridade."
Aracy atuou espremida entre o nazismo alemão e o Estado Novo de Getúlio Vargas, no contexto maior de uma era que o filósofo britânico Isaiah Berlin definiu como "a mais terrível da história". O Brasil atravessava tempos de racismo e xenofobia. Desde 1921, sucessivos governos vinham criando barreiras à entrada dos "apátridas" da Primeira Guerra Mundial, em especial aos judeus russos fugidos da Revolução Bolchevique de 1917, tratados num documento oficial como "semitas indesejáveis para compor a população brasileira". Em 1933, Adolf Hitler tomou o poder na Alemanha e começou a perseguir judeus, ciganos, homossexuais, liberais, socialistas e comunistas. No Brasil, a Assembléia Constituinte de 1934 discutiu abertamente políticas de "branqueamento", a eugenia estava em alta, o assunto da hora era o "perigo amarelo" (os japoneses) e nossas elites acreditavam na relação entre a etnia e a ética. Chegou-se a discutir a proibição à imigração de japoneses e negros, mas logo essa aberração foi substituída por cotas de imigração, que privilegiavam alemães, portugueses e suecos. Em 1935, Hitler criou as Leis de Nuremberg contra os judeus e começou a avançar sobre o Leste Europeu. Aumentou então a fuga de judeus para as Américas. De início, eles entravam no Brasil na cota de alemães e austríacos. O Itamaraty reagiu com a Circular Secreta 1127, de 1937, restringindo a entrada de todos os "semitas". As embaixadas brasileiras na Europa tinham ordens expressas do Itamaraty para não conceder vistos a judeus. As representações mais duras foram as da Alemanha, onde o embaixador Cyro de Freitas Vale era um germanófilo, anti-semita e simpatizante assumido do nazismo, e da Itália, onde o encarregado de negócios, Jorge Latour, também era um anti-semita agressivo. O chefe de Aracy, o cônsul-geral do Brasil em Hamburgo, Joaquim de Souza Ribeiro, não era anti-semita, mas um diplomata disciplinado. Dificultava ao máximo a concessão de vistos a judeus para não desagradar ao embaixador e ao governo. "Eram raríssimos os funcionários do Itamaraty que ajudavam os judeus", diz a professora da USP Maria Luiza Tucci Carneiro, autora de O anti-semitismo na era Vargas. "Se a Aracy facilitou, o fez correndo perigo."
Aquela senhora centenária, quase esquecida num apartamento dos Jardins, não se lembra de mais nada disso. Reservada, no passado ela pouco falou de sua epopéia, que veio à luz através dos depoimentos de alguns de seus protegidos - quase todos mortos. Duas pesquisadoras brasileiras, Adriana Jacobsen e Soraia Vilela, neste momento estão na Alemanha investigando a história de Aracy e de Guimarães Rosa naqueles tempos de trevas para produzir um documentário de longa-metragem. Talvez assim seja possível às novas gerações saber que um dia existiu uma brasileira chamada Aracy Guimarães Rosa, conhecida entre os judeus como "o anjo de Hamburgo". Hoje assisti o filme documentário no canal Arte 1, que bom ter meios de comunicação para não deixar esquecer e difundir nossos verdadeiros heróis e heroínas como é o caso de Dona Aracy. Confesso que chorei diversas vezes em ver os tristes relatos e ao mesmo tempo saber que a mídia cria falsos heróis para um povo que continua "massa de manobra" de uma mídia consumista e pobre de reconhecimento que não tem a preocupação de mudar nosso País para melhor ..... |