Modelo de gestão privada aumenta público de museus de São Paulo
As Organizações Sociais introduziram métodos de gestão privada na administração cultural. Viraram um caso de sucesso de público e crítica
A Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp) é hoje uma referência. Considerada a melhor da América Latina, ela realiza mais de 200 concertos anuais. Fez turnês aclamadas pela Europa, de onde vem parte considerável de seus integrantes. Nem sempre foi assim. Em meados da década passada, a Osesp, na memória de Evelyn Levy, consultora em gestão pública do Banco Mundial, estava um caos. “Eu me lembro do John Neschling (então maestro da Osesp) me ligando para dizer que todas as partituras estavam no chão porque ele não conseguia comprar um armário. Depois, dizendo que precisávamos consertar o elevador, mas a licitação demorava nove meses. Depois, que tínhamos de levar os passaportes dos músicos para a Polícia Federal, porque eles não tinham um contrato de trabalho formal”, diz Evelyn.
O que mudou em tão pouco tempo? Simples: a Osesp passou a ser gerida como uma empresa privada. Hoje, 64% do orçamento anual da Osep – de R$ 87 milhões – é oriundo do governo do Estado de São Paulo. Os 36% restantes vêm de patrocínios, doações e projetos incentivados, além das verbas obtidas com vendas de ingresso e locação de espaços. Evelyn, que estava na Casa Civil do governo paulista em 2004, foi uma das pessoas que trabalharam na implantação de um novo modelo de gestão mais próximo da iniciativa privada e mais distante da burocracia estatal. Esse modelo hoje está em vigor em importantes órgãos culturais paulistas – quase todos, sucesso de crítica e, principalmente, de público.
O que mudou em tão pouco tempo? Simples: a Osesp passou a ser gerida como uma empresa privada. Hoje, 64% do orçamento anual da Osep – de R$ 87 milhões – é oriundo do governo do Estado de São Paulo. Os 36% restantes vêm de patrocínios, doações e projetos incentivados, além das verbas obtidas com vendas de ingresso e locação de espaços. Evelyn, que estava na Casa Civil do governo paulista em 2004, foi uma das pessoas que trabalharam na implantação de um novo modelo de gestão mais próximo da iniciativa privada e mais distante da burocracia estatal. Esse modelo hoje está em vigor em importantes órgãos culturais paulistas – quase todos, sucesso de crítica e, principalmente, de público.
O modelo adotado são as Organizações Sociais (OSs), como são chamadas as entidades do Terceiro Setor que administram instalações públicas ou programas do governo em parceria com o Estado, como hospitais, escolas, museus e centros de pesquisa. Para que sejam qualificadas como tal, elas não devem ter fim lucrativo. Toda eventual sobra em seu balanço deve ser investida no patrimônio do equipamento, que continua sendo público. Em sua maioria, as OSs são fundações ligadas a escolas públicas ou privadas, entidades filantrópicas e associações de amigos.
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Desde 2005, quando os equipamentos de cultura paulistas passaram a ser administrados pelas Organizações Sociais, o número de visitantes dos museus do Estado aumentou 260%, segundo levantamento obtido por ÉPOCA (leia o quadro abaixo). As entidades também foram incentivadas a procurar fontes externas de recursos, como doações e patrocínios. A Pinacoteca do Estado de São Paulo captou cerca de R$ 1,6 milhão com atividades e produtos diversos em 2011, superando em 6% a meta do contrato de gestão. Outros R$ 7 milhões vieram de patrocinadores. No total, a Pinacoteca recebeu em fontes externas cerca de 25% de seu orçamento.
Agora, o modelo paulista começa a ser implantado em outros Estados, como o Rio de Janeiro. No mês passado, a prefeitura do Rio inaugurou um museu administrado nesses moldes, o Museu de Arte do Rio, gerido pelo Instituto Odeon. “Sou um ardoroso defensor desse modelo. Ele se encaixa perfeitamente para o setor da cultura”, diz Marcelo Araújo, secretário da Cultura de São Paulo e ex-diretor da Pinacoteca.
Desde 2005, quando os equipamentos de cultura paulistas passaram a ser administrados pelas Organizações Sociais, o número de visitantes dos museus do Estado aumentou 260%, segundo levantamento obtido por ÉPOCA (leia o quadro abaixo). As entidades também foram incentivadas a procurar fontes externas de recursos, como doações e patrocínios. A Pinacoteca do Estado de São Paulo captou cerca de R$ 1,6 milhão com atividades e produtos diversos em 2011, superando em 6% a meta do contrato de gestão. Outros R$ 7 milhões vieram de patrocinadores. No total, a Pinacoteca recebeu em fontes externas cerca de 25% de seu orçamento.
Agora, o modelo paulista começa a ser implantado em outros Estados, como o Rio de Janeiro. No mês passado, a prefeitura do Rio inaugurou um museu administrado nesses moldes, o Museu de Arte do Rio, gerido pelo Instituto Odeon. “Sou um ardoroso defensor desse modelo. Ele se encaixa perfeitamente para o setor da cultura”, diz Marcelo Araújo, secretário da Cultura de São Paulo e ex-diretor da Pinacoteca.
Diante desses resultados positivos em São Paulo, é válido perguntar: a expansão das Organizações Sociais seria uma solução para o setor de cultura, quase sempre relegado a segundo plano pelos governantes na hora da distribuição das verbas públicas? A resposta tem esbarrado numa questão política: o conceito de OS tem DNA de um partido, o PSDB. Ele surgiu com a Reforma do Estado, promovida no primeiro governo Fernando Henrique Cardoso, em 1998, sob a batuta do então ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, hoje um ex-tucano. Com o objetivo de tornar a máquina pública mais racional, as responsabilidades estatais foram divididas em duas categorias. A primeira são as atividades exclusivas do Estado, como segurança, fiscalização e benefícios sociais. Os serviços não exclusivos podem ser divididos com a sociedade civil, por meio de contratos de gestão com metas e mecanismos de transparência e controle. Desde então, União, Estados e municípios foram autorizados a repassar recursos para que as OSs administrem bens públicos e programas nas áreas de cultura, saúde, meio ambiente, tecnologia e pesquisa. Esses contratos dispensam instrumentos obrigatórios da administração pública, como licitação e concurso para a contratação de funcionários.
O campo político oposto aos tucanos, comandado pelo PT, faz duas críticas principais ao modelo. A primeira diz que as OSs privatizam atividades que deveriam ser estatais. A segunda diz respeito à falta de capacidade dos órgãos públicos em definir metas e diretrizes na hora de firmar os contratos. Em São Paulo, a cada eleição, o modelo entra na pauta dos debates. No ano passado, o então candidato Fernando Haddad (PT), atual prefeito de São Paulo, dizia em sua campanha que queria rever os contratos das OSs firmados na capital, especialmente na área de saúde. Uma vez no poder, Haddad manteve os contratos existentes. Seu secretário de Cultura, o ex-ministro Juca Ferreira, diz que equipamentos com corpo estável, como o Teatro Municipal, poderão ser administrados pelas OSs. Até agora, não confirmou se adotará ou não o modelo.
Na gestão tucana do Estado, a visão sobre as OSs, obviamente, é outra. A lista de museus administrados pelas OSs inclui sucessos como o Museu da Língua Portuguesa e o Museu do Futebol, ambos montados em parceria com a Fundação Roberto Marinho. Atualmente, há 20 OSs com contratos de gestão com a Secretaria da Cultura. Elas são responsáveis por cerca de 400 polos do Projeto Guri (de integração social de jovens por meio da cultura), 18 museus, seis salas de espetáculo, sete Fábricas de Cultura, 21 Oficinas Culturais, duas escolas profissionalizantes de música e a Biblioteca de São Paulo.
Na gestão tucana do Estado, a visão sobre as OSs, obviamente, é outra. A lista de museus administrados pelas OSs inclui sucessos como o Museu da Língua Portuguesa e o Museu do Futebol, ambos montados em parceria com a Fundação Roberto Marinho. Atualmente, há 20 OSs com contratos de gestão com a Secretaria da Cultura. Elas são responsáveis por cerca de 400 polos do Projeto Guri (de integração social de jovens por meio da cultura), 18 museus, seis salas de espetáculo, sete Fábricas de Cultura, 21 Oficinas Culturais, duas escolas profissionalizantes de música e a Biblioteca de São Paulo.
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Na área da cultura, as OSs vieram regularizar a atuação das associações de amigos, que, no fim da década de 1990, geriam grandes projetos culturais de forma irregular, segundo afirma José Veríssimo Romão Netto, pesquisador do Núcleo de Pesquisa em Políticas Públicas da USP. “As relações entre governo e Associações de Amigos deixavam margem para muitos questionamentos. Havia um convênio dizendo que as tarefas seriam divididas, mas, na verdade, o Estado apenas repassava os recursos.” Romão Netto defende o modelo das OSs por considerar a cultura uma área muito peculiar para “encaixar dentro das regras do Estado”. “É difícil o Estado entender a dinâmica da área de cultura. Como licitamos algo como a arte?”
O consenso é que não deve haver retrocesso na implantação nesse modelo de gestão, adotado com sucesso também em outros países, como Holanda e Áustria. O debate agora deveria se concentrar no aperfeiçoamento da transparência e na fiscalização dos contratos pelo Poder Público, hoje mal equipado para fazer isso. “As Organizações Sociais inovaram porque estabeleceram uma parceria público-privada que se orienta para resultados, diretrizes e metas”, afirma o conselheiro Maurício Faria, do Tribunal de Contas do Município de São Paulo. “Isso significa que o Poder Público deve se capacitar para outra atividade, a supervisão e gestão estratégica dessa parceria.” O secretário da Cultura de São Paulo, Marcelo Araújo, reconhece a necessidade de “aperfeiçoar” o modelo. “É preciso uma adequação da estrutura interna do Estado, para que ele possa fazer face a esse novo modelo de gestão”, diz. Onde o Estado é pouco eficiente ou detém pouco conhecimento, como a área de cultura, o melhor é deixar a gestão para quem sabe. O sucesso das OSs em São Paulo mostra que esse é o rumo certo a ser seguido.
Na área da cultura, as OSs vieram regularizar a atuação das associações de amigos, que, no fim da década de 1990, geriam grandes projetos culturais de forma irregular, segundo afirma José Veríssimo Romão Netto, pesquisador do Núcleo de Pesquisa em Políticas Públicas da USP. “As relações entre governo e Associações de Amigos deixavam margem para muitos questionamentos. Havia um convênio dizendo que as tarefas seriam divididas, mas, na verdade, o Estado apenas repassava os recursos.” Romão Netto defende o modelo das OSs por considerar a cultura uma área muito peculiar para “encaixar dentro das regras do Estado”. “É difícil o Estado entender a dinâmica da área de cultura. Como licitamos algo como a arte?”
O consenso é que não deve haver retrocesso na implantação nesse modelo de gestão, adotado com sucesso também em outros países, como Holanda e Áustria. O debate agora deveria se concentrar no aperfeiçoamento da transparência e na fiscalização dos contratos pelo Poder Público, hoje mal equipado para fazer isso. “As Organizações Sociais inovaram porque estabeleceram uma parceria público-privada que se orienta para resultados, diretrizes e metas”, afirma o conselheiro Maurício Faria, do Tribunal de Contas do Município de São Paulo. “Isso significa que o Poder Público deve se capacitar para outra atividade, a supervisão e gestão estratégica dessa parceria.” O secretário da Cultura de São Paulo, Marcelo Araújo, reconhece a necessidade de “aperfeiçoar” o modelo. “É preciso uma adequação da estrutura interna do Estado, para que ele possa fazer face a esse novo modelo de gestão”, diz. Onde o Estado é pouco eficiente ou detém pouco conhecimento, como a área de cultura, o melhor é deixar a gestão para quem sabe. O sucesso das OSs em São Paulo mostra que esse é o rumo certo a ser seguido.